Por Uma Ideia de Escola

Cotidiano Extraordinário


A escola, enquanto organização educativa, expressa um caráter formador a partir das relações sociais estabelecidas. Nesse sentido, entendemos que há um processo de escolhas intencionais no âmbito das práticas construídas na escola que estão diretamente relacionadas à concepção de educação e de criança, sustentada pela comunidade educativa.

Portanto, a escola que desejamos construir considera a indissociabilidade entre relação humana e produção de conhecimento nas experiências vividas, propondo sua organização de modo que as crianças sejam respeitadas em seus processos de subjetivação, relações e aprendizagem.

Ao mesmo tempo, devemos garantir o direito delas de ter acesso, contato e se aprofundar, de maneira reflexiva, nos conhecimentos historicamente produzidos pela sociedade como um todo, não somente os dominantes e estabelecidos.

Essa concepção de criança e de educação que permeia nosso pensamento se reflete diretamente em nossa prática. Práticas discursivas não formam somente o modo como enxergamos o mundo, ou em nosso caso específico, o modo como enxergamos as crianças. Esse entendimento, por guiar ações e percepções cotidianas de nós como educadores, é muito importante na formação da criança enquanto indivíduo. Por isso é necessário que essa imagem seja, a todo o momento, confrontada e refletida.

É fundamental para nós refletir de forma ética sobre as sutilezas das relações de vida no cotidiano da escola, pensar de forma intencional nossas falas, ações e problematizações pautadas em respeito com o ser humano, alargar e deslocar o olhar e o pensamento em comunhão com as crianças e educadores, sendo, portanto, uma escolha política. Aceitar, permitir e viver um processo de transformação profundo, contínuo e permanente que nos move a sermos educadores, e não apenas “estarmos” educadores, equivale considerar que o propósito da educação não se relaciona apenas ao indivíduo, mas também a nós – à comunidade, aos outros.

O contexto investigativo é um momento importante na nossa estrutura cotidiana, que orienta as práticas, organiza os espaços, e potencializa as relações entre as crianças.

Os educadores são fundamentais nesse processo, eles escutam as crianças e planejam esses contextos que podem emergir da própria vida em coletivo, de um problema real dos interesses e desejos; garante o diálogo nos pequenos grupos; oportuniza o transitar entre as linguagens expressivas como forma de aprendizado.

Desse modo, expressa uma escolha intencional de um projeto pedagógico de escola e de mundo. Tal qual presente nos documentos oficiais que orientam as escolas de todo o Brasil, essa criança é, para nós, “sujeito histórico e de direitos que se desenvolve nas interações, relações e práticas cotidianas a ela disponibilizadas e por ela estabelecidas com adultos e crianças de diferentes idades nos grupos e contextos culturais nos quais se insere.

Nessas condições ela faz amizades, brinca com água ou terra, faz-de-conta, deseja, aprende, observa, conversa, experimenta, questiona, constrói sentidos sobre o mundo e suas identidades pessoal e coletiva, produzindo cultura.

Organizar o cotidiano na escola alinhado a essa imagem é o que nos dispomos a fazer – todos os dias – no intuito de formar cidadãos críticos, reflexivos e com uma práxis progressista que tenha consciência do mundo em que vive, seu papel e de seus pares nesse mundo, se colocando em movimento, como transformadores de sua realidade e seu entorno.

POR UMA IDEIA DE CRIANÇA*

Por uma ideia de criança rica,
na encruzilhada do possível,
que está presente
e que transforma o presente em futuro.
Por uma ideia de criança ativa,
guiada, na experiência,
por uma extraordinária espécie de curiosidade que se veste de desejo e de prazer.
Por uma ideia de criança forte,
que rejeita que sua identidade seja
confundida com a do adulto, mas que a oferece a ele nas brincadeiras de cooperação.
Por uma ideia de criança sociável,
capaz de se encontrar e se confrontar
com outras crianças
para construir novos pontos de vista e conhecimentos.
Por uma ideia de criança curiosa,
que aprende a conhecer e a entender
não porque renuncie, mas porque nunca deixa de se abrir ao senso do espanto e da maravilha.
ALDO FORTUNATI [2009]

VISÃO DE CRIANÇA

Potencialidades de aprendizagem como processo de construção subjetivo e social

As crianças são expressões de um mundo complexo e inesgotável, de energias, potencialidades, surpresas e também de fragilidades - que vão sendo conhecidas, observadas e acompanhadas com cuidado, estudo, responsabilidade e atenção. São portadoras de especiais e inalienáveis direitos, codificados internacionalmente, aos quais a escola é primeiramente chamada a respeitar.

Consolidar sua identidade significa viver serenamente as dimensões de si mesmo na multiplicidade do fazer e sentir, aprender a conhecer-se e a ser reconhecido como pessoa única e irrepetível que contribui para uma comunidade. Desenvolver autonomia articulando suas ideias e atitudes com as dos outros, de maneira independente, cooperativa e consciente.

As crianças são dotadas de potencialidades extraordinárias de aprendizado e de mudanças, de múltiplos recursos afetivos, relacionais, sensoriais, intelectuais, que se explicitam numa troca incessante com o contexto cultural e social. Encontrar com suas competências e desenvolvê-las significa brincar, movimentar-se, manipular, curiosar, perguntar, aprender a refletir sobre as experiências por meio da exploração, da observação e do confronto entre a propriedade, quantidade, características, fatos; significa escutar e compreender narrações e discursos, contar e evocar ações e experiências e traduzi-las em traços pessoais e compartilhados; ser capaz de descrever, representar e imaginar, “repetir”, por simulações e jogos de papel, situações e eventos com linguagens diversas.

A escola reconhece a pluralidade de elementos que cria tantas possibilidades de crescimento, emotivo e cognitivo juntos. A aprendizagem advém da ação, da exploração, do contato com os objetos, pessoas, natureza, arte, território, em uma dimensão lúdica, entendida como forma típica de relacionamento e de conhecimento. Na brincadeira, em particular no jogo simbólico, as crianças se expressam, narram, reelaboram de modo criativo as experiências pessoais e sociais. Na relação educativa, os educadores desenvolvem uma função de mediação e de facilitação e, ao fazer a própria pesquisa das crianças, as ajudam a pensar e a refletir melhor, solicitando-as a observar, descrever, narrar, criar hipóteses, dar e pedir explicações em contextos cooperativos e de confronto difuso.


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